Se você tem um hatch médio com câmbio manual, aproveite a sensação de pisar na embreagem e trocar as marchas. Ainda que essa opção seja uma das favoritas de quem gosta de dirigir, ela está em extinção.
Os novos Ford Focus e Chevrolet Cruze Sport6 são exemplos disso. A dupla só tem uma opção para quem busca um hatch médio com caixa manual – e ambas são suas versões iniciais.
Na prática, Focus SE 1.6 e Cruze Sport6 LT visam o consumidor menos abonado, atingindo, por tabela, os fãs dos “três pedais”. A boa notícia é que, mesmo sendo as opções mais baratas da linha, a dupla é bem equipada. Recém-lançado, o Focus 1.6 perdeu a versão S e agora parte da SE, mais completa, por R$ 69.900.
De série o modelo tem trio elétrico, controle de estabilidade com assistente de partida em rampa, sistema de som com Bluetooth e duas entradas USB, rodas de 17”, sensor crepuscular e de chuva e retrovisor interno eletrocrômico. Por R$ 2.000, o pacote Plus do carro mostrado nas fotos deste comparativo adiciona ar-condicionado digital de duas zonas, sensor de estacionamento, controlador de velocidade e airbags laterais.
O Cruze Sport6 LT se equivale ao Focus em quase tudo, mas soma airbags laterais e ar-condicionado automático (de uma zona) de série. Faltam sensor de estacionamento e sensor crepuscular, mas só ele possui luzes diurnas de LEDs.
No mercado, o Focus sai na frente e hoje lidera o segmento com folga. o Cruze Sport6 disputa a segunda posição com o Volkswagen Golf, cuja versão manual existe apenas no configurador no site da marca e custa R$ 75.080.
A Ford argumenta que 40% das vendas do novo Focus serão da versão 1.6. O volume considerável, porém, não se reflete em uma boa aceitação na hora da revenda. Segundo a consultoria Jato Dynamics, o hatch feito na Argentina perde 29,3% de seu valor após um ano de uso, contra meros 7,6% da versão 2.0 automática. No Cruze não é diferente: quem quer trocar marcha perde 27,5%, ante 9,3% do modelo automático.
Como se não bastasse, surrealmente, a dupla tem a apólice de seguro mais cara que seus equivalentes automáticos. Com peças mais baratas e custo de reparo menor, a única explicação plausível é a suposta vocação esportiva que esses modelos possuem. Se bem que é exatamente por isso que vale a pena considerar sua compra se você adora um câmbio manual.
BATISMOS OPOSTOS
A proposta mais apimentada do Cruze hatch em relação ao sedã fica exposta até em seu nome. Ainda que ele não seja exatamente um esportivo, o Sport6 agrada mais no quesito prazer ao dirigir que sua derivação três-volumes.
A Ford foi para o lado oposto, e reservou ao antigo Focus Sedan o termo Fastback, comum em cupês. Talvez por isso o Focus hatch 1.6 está mais para um modelo verdadeiramente de entrada do que uma real alternativa aos fãs dos três pedais. Seu motor 1.6 é uma versão anabolizada do propulsor adotado no Fiesta e gera consideráveis 135 cv e 16,6 mkgf de torque com etanol. Seu câmbio manual de cinco marchas manteve os bons engates da versão anterior, mas a alavanca poderia ser um pouco mais curta.
O Cruze manteve o 1.8 que equipa as versões automáticas. O motor moderno tem saudáveis 144 cv e 18,9 kgfm. A força extra é mais bem aproveitada por um câmbio manual de seis marchas com manopla de textura agradável. O trem de força bate o do Focus até em aspectos mais subjetivos, como o ronco do escapamento, mais grave e encorpado no Chevrolet.
Com mais potência e um câmbio melhor, o Cruze venceu o Focus nas medições de desempenho. A diferença nas acelerações chegou a superar os dois segundos, assim como as retomadas. Na prática essa variação pode resultar em ultrapassagens seguras ou em irritação extra atrás de um caminhão na estrada. A suspensão macia não entrega a mesma sensação de estabilidade em curvas, mas é muito mais confortável no castigado asfalto das ruas brasileira.
Todo esse fôlego do Cruze não vem de graça, e o preço é um consumo mais elevado, tanto na cidade quanto na estrada. O acabamento do Sport6 também fica abaixo do encontrado no Focus, com maior quantidade de peças de plástico rígido. Mas a simplicidade tem suas vantagens: por ter assento plano, o banco traseiro recebe melhor o quinto ocupante, que tem cinto de três pontos e apoio de cabeça nos dois carros.
O espaço interno do Sport6 é levemente superior ao do Focus, mas truques como a porta traseira maior diminuem a sensação de claustrofobia de quem vai atrás. O porta-malas é generoso e supera quase todos no segmento. Uma falta grave é a ausência do sensor de estacionamento, que atrapalha ainda mais as manobras do Cruze, já que sua visibilidade traseira é pior que no Ford.
A reestilização do Focus trouxe uma sensível melhora na cabine. O rádio tem display pequeno, mas moderno, e conta com duas entradas USB, recurso cada vez mais essencial em um mundo repleto de gadgets sedentos por energia. Os bancos de couro do pacote Plus têm visual bonito e são agradáveis para quatro adultos. Mas a Ford ainda precisa melhorar a qualidade de montagem de seus carros: o acabamento da tampa do porta-malas na unidade avaliada estava mal encaixado, prejudicando o fechamento do compartimento de carga.
FICHAS TÉCNICAS | Chevrolet Cruze Sport6 LT | Ford Focus 1.6 SE |
Velocidade máxima: | 203 km/h | 189 km/h |
Motor disposição/válvulas: | diant., trans., 4 cil./16V | diant., trans., 4 cil./16V |
Cilindrada: | 1.796 cm³ | 1.596 cm³ |
Potência: | 144 cv a 6.300 rpm | 135 cv a 6.500 rpm |
Torque: | 18,9 kgfm a 3.800 rpm | 16,6 kgfm a 3.000 rpm |
Câmbio: | manual, 6 marchas | manual, 5 marchas |
Suspensão (d/t): | McPherson/eixo de torção | McPherson/multibraço |
Peso vazio/cap.máx. de carga: | 1.398 kg/471 kg | 1.310 kg/515 kg |
Diâmetro de giro: | 10,6 m | 10,7 m |
Porta-malas: | 402 l | 316 l |
Tanque de combustível: | 60 | 55 |
Pneus (veículo testado): | Kumbo 225/50 R17 | Michelin Primacy3 215/50 R17 |
Dimensões (CxLxA): | 4,52 m/1,79 m/1,47 m | 4,36 m/1,82 m/1,46 |
Entre-eixos: | 2,68 m | 2,64 m |
No dia a dia, o Focus entrega um desempenho correto, desde que você não se incomode em fazer constantes trocas de marcha. O motor trabalha melhor acima das 3.000 rpm, interferindo diretamente no ruído interno. Com suspensão e direção mais firmes e agradáveis em uma condução mais esportiva, o Focus merecia o motor e o câmbio do Cruze.
Do jeito que está, o Chevrolet compensa o projeto mais antigo com força e espaço superior. Desempenho, no Focus, só se você aceitar a versão automática com motor 2.0 de 178 cv.
NOSSAS MEDIÇÕES | Chevrolet Cruze Sport6 LT | Ford Focus 1.6 SE |
Aceleração: | ||
0-60 km/h: | 4s7 | 5s6 |
0-80 km/h: | 7s2 | 8s6 |
0-100 km/h: | 11s0 | 13s1 |
0-120 km/h: | 15s2 | 18s3 |
Retomada: | ||
40-100 km/h em 3ª marcha | 10s9 | 13s4 |
60-120 km/h em 4ª marcha | 16s6 | 18s9 |
80-120 km/h em 4ª marcha | 11s3 | 13s7 |
Frenagem: | ||
60-0 km/h: | 14,6 m | 13,7 m |
80-0 km/h: | 24,9 m | 23,9 m |
100-0 km/h: | 36,9 m | 37,7 m |
Consumo (etanol): | ||
Cidade: | 6,5 km/l | 7,4 km/l |
Estrada: | 10,2 km/l | 11,1 km/l |
PECO: | 8,1 km/l | 9,0 km/l |
CONCLUSÃO
Sempre gostei do Focus, desde sua primeira geração. Em sua versão 2.0 ele é gostoso de dirigir e possui suspensão bem calibrada. Mas o modelo 1.6 perde tanto em desempenho que acabou sendo obliterado pelo envelhecido Cruze Sport6. O espaço interno superior também falou mais alto no Chevrolet, que tem suspensão mais agradável no dia a dia. Quando chegar a nova geração do hatch, prevista para 2016, a diferença entre a dupla tende a ser ainda maior. A Ford melhorou o acabamento do seu médio e finalmente alinhou o design com o que é oferecido na Europa. Resta a ela equipar as versões iniciais com um motor mais potente, à altura do visual modernizado do Focus.