Nuvens escuras no horizonte anunciam que a tempestade vai chegar em breve. Estamos no autódromo de Misano, na Itália, e a ideia de ter o trabalho interrompido pela chuva não me agrada. Ainda mais depois da longa viagem desde a Alemanha. Então, o negócio é acelerar o ritmo.
Com o polegar aciono o botão de partida localizado no volante, que lembra o de um Fórmula 1, seja pelo seu formato, seja por seus vários botões. O comando é seguido por um ruído grave. O V8 de 6,3 litros e aspiração natural tem um ronco maravilhoso, inigualável.
Pelo rádio, anunciam que a pista de 4,2 km de extensão está liberada, então a versão GT3 do Mercedes-AMG GT está pronta para iniciar o nosso teste exclusivo.
O motor segue ligado até atingir uma temperatura mais adequada, enquanto converso com o alemão Thomas Jäger, piloto da Mercedes, que está ao lado da porta de plástico reforçado com fibra de carbono. “Agora podemos agradecer a troca das portas antigas (estilo asa de gaivota) por essas, convencionais. No começo, sempre batíamos a cabeça nas trocas de pilotos. Como o ângulo de abertura das portas ficou maior, conseguimos realizar a troca de pilotos com maior rapidez”, explica Jäger.
O piloto se acomoda de maneira relaxada em um banco feito sob medida, também de plástico reforçado com fibra de carbono e revestido de espuma. E não são apenas os pedais que podem ter a distância ajustada, mas também o volante.
Aciono a embreagem e tomo cuidado redobrado na hora de liberá-la. O carro parte um pouco cambaleante, mas pelo menos não deixo o motor morrer (não é fácil se acostumar com um carro de corrida, acredite). O câmbio sequencial está montado na traseira (transeixo) e tem respostas rápidas, facilitando a adaptação. O motor de aspiração natural, como já foi dito, tem um ronco inebriante e encantador, ainda mais na clássica configuração V8.
Saio do pit lane, mas não posso esquecer que ainda é preciso aquecer os pneus slick de competição. É uma boa oportunidade para me familiarizar com o circuito italiano. Ao contrário da versão de rua, este não conta com o V8 biturbo de 4 litros sob o capô, mas sim com o de 6,3 litros de aspiração natural, que ganhou fama por equipar a versão Black Series do antecessor SLS AMG com impressionantes 631 cv.
LIMITADO
Por conta das restrições da categoria GT3, o motor entrega “apenas” 550 cv. “Em um motor turbo, problemas mecânicos podem ser bem mais complicados para os nossos clientes. Nas competições, a facilidade de utilização e de manutenção é muito importante”, explica novamente o piloto Thomas Jäger.
Assista ao vídeo oficial (em inglês) do Mercedes-AMG GT3:
Um bom exemplo de como a Mercedes trabalhou nesse sentido é o fato de os intervalos de serviço do novo GT3 terem passado para 20.500 km, contra 14.000 km do SLS GT3. Isso proporciona economia, já que apenas a revisão do motor custa 30 mil euros, ou o preço de um CLA 180 na Europa.
ACELERANDO
Com os pneus aquecidos, chegou a hora de pisar fundo. E, pela reação do GT3 na reta principal, a impressão era de que o motor entrega muito mais que os 550 cv. O motivo disso é que, de acordo com a Mercedes, ele pesa apenas 1.285 kg, ou seja, ele não somente é 360 kg mais leve que a versão de rua, como ainda pesa 50 kg a menos que o antigo SLS GT3.
Verde, amarelo, vermelho… As luzes à frente do volante piscam numa sequência frenética, indicando o momento das trocas de marcha. Terceira, quarta, quinta e então surgem as placas indicando a distância para a próxima curva. Pé no freio com vontade e é a vez da borboleta do lado esquerdo trabalhar seguidamente.
A produção do GT3 pela Mercedes-AMG é praticamente artesanal. Apenas oito carros como o dessa reportagem são feitos por mês.
Thomas Jäger deixou o seletor do ABS ligado na posição 7. “Há dez opções de atuação do ABS. Para Nürburgring Nordscheife, com suas irregularidades e bumps, temos um nível adicional”, conta. “Quando as rodas dianteiras estão bloqueando, uma luz azul acende no painel. Já quando são as traseiras, é uma luz rosa. O alerta surge pouco antes do travamento, porque nem sempre é possível perceber quando as rodas estão bloqueando, ao contrário do carro de passeio.”
Incrível também é a rapidez com que o GT3 para, o que gera ainda mais confiança. A ótima distribuição de peso, por sua vez, contribui para manter o equilíbrio do carro, mesmo nas frenagens mais abruptas. “Isso permite controlar melhor o eixo dianteiro, o que não ocorria tão bem no SLS”, lembra Jäger. Mesmo assim, nas curvas mais apertadas de Misano, o GT3 apresenta um leve subesterço. Mas nada que prejudique a condução esportiva. Só é preciso lembrar que a aerodinâmica refinada deste Mercedes-AMG também tem mérito nesse comportamento.
Minha experiência com essa máquina fantástica está chegando ao fim. Em minha última volta, aproveito para curtir cada ruído e tentar guardá-los na memória. O céu no horizonte continua carrancudo, mas a tempestade parece que não vem mais. A bordo do novo GT3, a impressão é que até o clima resolveu ficar a meu favor.
Tradução e adaptação: Wilson Toume, da CARRO