Como você conferiu no especial anterior, mostramos como o automóvel evoluiu pouco, se comparado a outras inovações, como o telefone celular. Este mês, seguimos explicando como o carro ainda pode recuperar terreno e dar um salto de modernidade. Vamos iniciar falando sobre os freios.
É o atrito entre duas superfícies diferentes que evita aquela situação em que você poderia se ver “abraçando o poste” ao perder o controle do seu carro em uma curva. A pinça de material cerâmico “morde” um disco de aço (nos freios a disco) e diminui a velocidade do veículo. Antigamente, uma tira de couro abraçava um tambor metálico para realizar a mesma tarefa. Em muitos veículos, esse conceito ainda existe. Os freios poderiam perfeitamente ser magnéticos (como os do Thrust SSC, o carro mais rápido do mundo), regenerativos (como na F1) e muito pouco utilizados, caso um computador soubesse conduzir o carro de maneira inteligente.
SUSPENSÃO E PNEUS
Para manter a carroceria acima do chão e dos buracos, o automóvel possui amortecedores, molas, braços de controle e quadros auxiliares. A peça que faz a comunicação entre a carroceria e o piso continua sendo o pneu de borracha, material que antes era 100% natural e agora é quase todo sintético. O pneu, porém, continua redondo e cheio de ar. Poderia ser incorporado à roda, fixado apenas por um parafuso, dispensar o ar em seu interior e quando se desgastasse, poderia ter apenas a banda de rodagem substituída. O mais incrível é que essa tecnologia existe há anos e já foi experimentada e aprovada, mas, sabe-se lá por qual motivo, nunca foi implantada em automóveis produzidos em série.
Já a suspensão (e seus componentes) poderia ser totalmente dispensada se a indústria automotiva adotasse a tecnologia de levitação magnética que já está presente nos modernos trens de alta velocidade conhecidos como MagLev.
MOTORES
A MDI, empresa suíça de motores e carros, fez aquilo que parecia impossível: um motor a ar (embora essa ideia seja estudada há mais de 200 anos). Ar comprimido, obtido por meio de um compressor simples, capaz de fazer um carrinho esquisito (o AirPod) rodar mais de 300 km com um tanque, com 80 cv e torque de sobra. O que ele emite? Ar esterilizado e gelado.
Motores de ultra-alta eficiência são caros, mas se pagam, como as lâmpadas de LED, que têm preço mais alto, mas duram 30 vezes mais e consomem pouco. Os motores elétricos hoje podem ser feitos de materiais nobres e utilizar enrolamentos baseados em supercondutores. A Siemens já faz isso e consegue obter 90% de eficiência energética. Faz sua geladeira parecer um chuveiro diante de tanto aproveitamento.
Como a indústria bélica parece ser mais ágil do que a automotiva, as metralhadoras possuem motores elétricos impressionantes. Uma arma dessas usa motores elétricos com 98% de eficiência. Não podem falhar e têm de ter durabilidade. Possuem ímãs permanentes de neodímio, enrolamentos de metais nobres que incluem ouro e carcaças de titânio para dar resistência mecânica e leveza. Se a tecnologia desses motores estivesse nos carros, os postos de combustíveis se transformariam em estacionamentos.
COMBUSTÍVEL
Como podemos queimar petróleo ou etanol nos dias de hoje? Tudo bem que o prazer de acelerar um Dodge Challenger HellCat queimando cinco litros de gasolina a cada 60s é inenarrável. Mas para ir ao trabalho ou levar as crianças à escola o melhor seria usar uma célula de tório do tamanho de uma garrafa de água. Seria entrar no carro, rosqueá-la no reator e ir embora. Daqui a dez anos, quando o carro já estiver no fim de sua vida útil, basta tirar a célula e colocá-la no novo. E seguir repetindo a operação até passá-la para o meu filho, neto, bisneto…
CÉLULA DE TÓRIO
O tório é um elemento químico pesado, de símbolo Th e número atômico 232. O elemento foi descoberto em 1828 pelo químico sueco Jons Jakob Berzelius, que escolheu o nome em referência ao deus nórdico Thor. É fracamente radiativo e produz muita energia térmica. Uma pequena pastilha de um grama fornece a mesma energia que 29.000 litros de gasolina, ou o suficiente para percorrer 348.000 km com uma média de 12 km/l. O tório produz calor e sua radiação é contida por uma simples folha de alumínio, ou seja, é perfeitamente utilizável em carros e casas.
Charles Stevens, fundador e presidente da Laser Power Systems, sediada em Connecticut, EUA, está testando o tório como combustível para veículos. Ele acredita que sua unidade de energia (que usa o calor do tório para produzir vapor d’água que movimenta uma turbina que gira um gerador elétrico), será um grande passo evolutivo para a motorização de veículos e energização de casas.
No filme Minority Report, o personagem vivido por Tom Cruise usa um veículo que se “encaixa” na varanda do apartamento e passa a energizar a casa. Hoje já temos o conceito da Nissan, o Smart House no qual o carro elétrico Leaf, ao ser ligado na tomada da garagem, tem a carga remanescente analisada por um software. Se restar energia na célula, o sistema drena essa energia para o consumo da casa até que se esgote e só então passa a recarregar a bateria. Isso ocorre de madrugada, quando o uso da rede elétrica é menor.
CÉLULAS A COMBUSTÍVEL
As células a combustível são capazes de gerar eletricidade por meio de uma reação química. Existem há muitas décadas, mas nunca foram aprimoradas. Células a combustível não armazenam energia, e sim a fornecem continuamente com a vantagem (velada, como veremos a seguir) de serem altamente eficientes e pouco poluentes. Podem ser utilizadas como sistemas de emergência, em zonas onde não existe rede elétrica, em aparelhos portáteis e veículos. Sua desvantagem é o alto custo. Normalmente utilizam o hidrogênio como elemento de fornecimento de energia e é aqui que está o problema.
Por que não é tão eficiente e limpa assim? O hidrogênio é difícil de obter. Por não ser uma fonte primária, precisa ser obtido através de processos caros e poluentes, como a eletrólise da água (decomposição da molécula em H2 e O) que utiliza grandes quantidades de energia elétrica. Outro método utilizado é a conversão do metano, mas dessa forma são liberados gases de efeito estufa que, no final das contas, tornam a célula tão ou menos eficiente que um motor a combustão.
ULTRACAPACITORES
Capacitores são elementos que armazenam energia elétrica através do princípio em que uma carga que flui entre duas placas metálicas tendo um material isolante entre elas se torna uma bateria. Assim, um capacitor pode armazenar energia por um longo tempo. Normalmente ele descarrega a carga de forma abrupta, mas isso pode ser contornado com controladores de descarga dinâmicos. Supercapacitores já são realidade e podem armazenar uma imensa quantidade de carga e devolvê-la gradativamente. Já os ultracapacitores seriam realidade se tivessem sido mais desenvolvidos há uns 50 anos. Hoje uma célula capacitiva orgânica poderia armazenar energia suficiente para o motor do carro durante semanas.
Lembra do grafeno (mencionado na edição passada) e de suas capacidades extraordinárias? Por ser ótimo condutor elétrico, ele também é um excelente armazenador de carga. Sua estrutura permite a fabricação de lâminas muito finas, com somente um átomo de espessura. Dessa forma, pode-se construir um ultracapacitor intercalando-se lâminas de grafeno e isolantes em uma embalagem pequena, mas capaz de armazenar milhares de amperes. Seguro, prático, leve e muito eficiente. Na próxima edição, seguiremos explicando como o automóvel pode evoluir e o que ele poderá ter no futuro.
Este artigo é parte de uma série sobre a evolução dos carros. Acompanhe!