Autoconfiança é essencial para qualquer pessoa. Mas tê-la em excesso pode se tornar um obstáculo, já que isso é facilmente interpretado como arrogância, como observou um executivo do setor de eletrônica da Mercedes-Benz, recordando uma conversa que teve com um representante da Apple: “Nós somos a Apple, você é apenas a Mercedes”, ouviu. Apesar disso, a fabricante alemã segue disposta a manter a cooperação com a gigante americana no projeto CarPlay — que prevê a adoção de uma interface nos automóveis de marcas como Mercedes-Benz, Ferrari, Volvo, Honda etc. para facilitar a conexão de iPhones.
Mas, embora esse projeto tenha sido anunciado com pompa no ano passado, até agora, ninguém se mostrou realmente entusiasmado com a parceria. O motivo é simples: a Apple não está disposta a compartilhar informações sobre sua plataforma tecnológica que considera estratégicas com as fabricantes de automóveis. Estas, por sua vez, temem revelar detalhes de seus futuros modelos para um aliado com essa desconfiança. E, de fato, fica difícil imaginar uma associação entre parceiros tão cismados.
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Não é de se estranhar, assim, que a Apple esteja negociando com a Magna (colaboradora de diversas fabricantes na Europa) para entender como um automóvel é construído. Tem mais: os americanos contrataram Johann Jungwirth, ex-Mercedes, que sabe tudo sobre os novos conceitos operacionais, sistemas de infotainment, telemática e de condução autônoma da marca. JJ, como é conhecido pelos amigos, era considerado peça fundamental na empresa alemã, mas foi seduzido por uma oferta da Apple que incluiu sua mudança para a ensolarada Califórnia.
Como se não bastasse, os americanos mantêm negociações com a BMW, que parece mais interessada em formar uma associação com a empresa da maçã. Os alemães, animados com os resultados dos modelos i3 e i8, desejam manter a posição de vanguarda em tecnologia. Para a Apple, os dois veículos se encaixam no conceito de “carro elétrico inovador”. E premium (ou caro). Assim, um i3 com a logomarca da maçã em vez da hélice estilizada pode ser uma solução melhor (e mais barata) do que criar um carro completo.
Mas ainda existem questões a serem resolvidas antes dessa parceria ser colocada em prática. Para o sistema iOS ser incorporado aos BMW, a montadora deve revelar detalhes estratégicos de seus modelos. Em troca, o que a Apple estará disposta a ceder? Como se não bastasse, um i3 com emblema da maçã certamente traria mais benefícios para a empresa americana.
Assim, o sonho de muitos fãs de um “iCar” pode demorar para se concretizar. E pior: ele pode depender mais da vaidade das pessoas do que de aspectos técnicos.
OPINIÃO DO REPÓRTER
“Uma maçã por dia ajuda a manter o médico longe.” Isso era o que dizia a minha avó quando eu era pequeno. Atualmente, porém, tal conselho só vale quando se deseja evitar problemas estomacais. Para a marca da maçã, no entanto, depois de investir com enorme sucesso em computadores, tablets e smartphones, contribuindo para revolucionar a conectividade, não é difícil imaginar que ela queira ingressar no setor automotivo e promover outra mudança, agora em termos de mobilidade.
Contudo, ao contrário do que algumas pessoas previram, essa nova revolução não trará carros com rodas triangulares ou sem volante. Para a Apple, o essencial será o seu sistema operacional desenvolvido para um automóvel. Assim, os californianos estão em busca de um parceiro que forneça a base e a infraestrutura necessárias, e que não tenha nada em comum com modelos convencionais. Nesse aspecto, o BMW i3 se encaixa perfeitamente, tanto em termos de tecnologia como de imagem. Uma série “i3 by Apple” bem que poderia ser um prenúncio dessa parceria inovadora. Aproveitando, uma questão me vem à cabeça: será que os altos executivos da Apple, acostumados atualmente a desfrutarem de veículos Bentley Mulsanne — absurdamente clássicos e convencionais —, estarão dispostos a trocá-los por modelos compactos e elétricos?