Há quase 29 anos trabalhando no grupo GM, o colombiano Jaime Ardila afirma que a empresa continua otimista com o Brasil, apesar da instabilidade do mercado nacional.
Carro • Qual é a maior diferença entre o Brasil dos demais países onde o senhor trabalhou?
Jaime Ardila • O mercado brasileiro é muito competitivo, todas as montadoras importantes estão aqui. A diferença é que, no Brasil, a maioria das empresas produz e distribui os veículos. O consumidor procura se informar e quer ter os itens básicos de segurança e de tecnologia, mesmo nos modelos básicos. O mercado daqui é muito volátil: pode ter períodos de crescimento rápido e quedas acentuadas, exigindo estruturas flexíveis em termos de custos. É um cenário desafiador e praticamente obrigatório para qualquer concorrente global da indústria automotiva.
Carro • Há solução para essa volatilidade?
Ardila • Existem formas de mitigar os ciclos econômicos, mas não um remédio para eliminá-los. Quando a economia vive um bom momento, a indústria reage, mas em caso de queda, o baque também é maior. O setor dependente muito da confiança do consumidor, que ainda vê o carro como investimento. Assim, quando a economia fica estagnada, o consumidor deixa de investir.
Carro • Não existe outro país com tantas marcas no mercado. Esse cenário é positivo e vai permanecer assim por muito tempo?
Ardila • É positivo, oferece ao consumidor opções globais. E a concorrência força as empresas a investirem em qualidade, tecnologia e segurança.
Carro • O que o senhor acha do Inovar-Auto?
Ardila • É uma medida acertada, porque vincula o desenvolvimento tecnológico, a economia de combustível e a redução de emissões com os investimentos que as empresas têm de fazer no país. Ela tenta “reservar” o mercado para as marcas que estão preparadas para fazer esses investimentos. Acredito que o programa passará por ajustes e avançará, além de 2017, para uma segunda fase. Minha única preocupação é o alto custo dos elementos tecnológicos que terão de ser incorporados aos veículos. É importante que governo e montadoras tratem desse assunto com carinho, para evitar que os carros modernos fiquem inacessíveis aos consumidores.
Carro • Qual é a importância da General Motors do Brasil para o grupo GM?
Ardila • O Brasil é o terceiro mercado mais importante para o grupo, atrás de China e Estados Unidos. Para a marca Chevrolet, isoladamente, o Brasil está em segundo, depois dos EUA. Além das vendas e da posição estratégica, o país é um local onde desenvolvemos novos produtos e engenharia para mercados emergentes.
Carro • A GMB ainda é responsável pelo desenvolvimento de utilitários médios?
Ardila • Sim, continuamos responsáveis pelas picapes médias em nível global e pelo desenvolvimento de veículos para países emergentes. O Cobalt, por exemplo, foi projetado aqui e é vendido na Rússia. Atualmente, não temos modelos brasileiros comercializados na Índia, mas o Spin é vendido na Indonésia. E, no futuro, nossos produtos estarão em todos os mercados emergentes.
Carro • A GM anunciou um investimento de
R$ 6,5 bilhões no país para permitir a renovação de seus produtos. Em 2012, havia divulgado um aporte de R$ 2 bilhões com o mesmo objetivo. Houve mudança de planos?
Ardila • Fizemos um plano de R$ 5,7 bilhões entre 2009 e 2013. Agora, tínhamos de anunciar o plano para os próximos anos. O de R$ 6,5 bilhões cobre todas as nossas necessidades entre 2014 e 2018. Inclui produtos novos, os requerimentos do Inovar-Auto e investimentos em tecnologia de conectividade, além da modernização de algumas fábricas e de motores e transmissões.
Carro • A preocupação com a conectividade é uma das mais imediatas da GM?
Ardila • Sim. Queremos que a Chevrolet seja a líder em conectividade do mercado automotivo. É nossa estratégia global e, no Brasil, ganha importância, devido à paixão do brasileiro pelo assunto.
Carro • Hoje, a Chevrolet possui modelos que “pedem” uma renovação, como Classic, Celta e Montana. Isso está previsto?
Ardila • Faremos renovações e substituições de produtos. Temos uma linha nova de modelos, que foi lançada recentemente, e outra, com um tempo maior de mercado. Esta será reformulada.
Carro • Existe alguma possibilidade de a fábrica de São José dos Campos (SP) fechar?
Ardila • Não. Vamos seguir produzindo a picape S10 e a Trailblazer lá. O que não temos é um plano de fazer um carro de passeio. Mas isso não significa que a fábrica encerrará suas atividades.
Carro • Atualmente, a Chevrolet disputa com a VW a vice-liderança no ranking. É importante conseguir firmar-se nessa posição?
Ardila • Nosso foco é o varejo. Ou seja, carros vendidos para nossos clientes nas concessionárias. Neste ano, somos os primeiros no varejo, indiscutivelmente. No ranking geral, podemos ocupar a terceira ou quarta posição, mas o que importa é liderar as vendas para pessoas físicas. Também queremos vender para empresas, locadoras etc., mas, para nós, isso tem uma importância menor que o cliente individual. Pretendemos, ainda, ser os primeiros no atendimento, oferecendo a melhor experiência de compra e no pós-venda.
Carro • Por que a Chevrolet não está no Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular?
Ardila • O governo nos deu três opções: investir em engenharia, em pesquisa e desenvolvimento ou ingressar no programa de etiquetagem. As empresas que aderissem ao Inovar-Auto teriam de cumprir duas delas. Optamos por investimento tecnológico e pesquisa e desenvolvimento de produtos. A etiquetagem, para nós, tem uma importância menor. Acreditamos que é muito mais relevante investir 1% da receita em tecnologia e outro 1% em pesquisa e desenvolvimento.
Carro • Valeu a pena a campanha da Chevrolet no varejo, que deu desconto de funcionário ao cliente que comprasse um 0 km?
Ardila • As vendas aumentaram 30%, embora não seja possível precisar se isso aconteceu apenas com a campanha. Foi uma estratégia para surpreender o mercado e deu certo.
Carro • O senhor acha que 2015 será difícil?
Ardila • Sim. Pelo visto, teremos uma queda considerável neste ano, e a recuperação deverá começar em 2015, mas não nos níveis de antes.