Um mito deve ser respeitado. Quando dois deles, separados por 45 anos de história, se encontram, então a reverência é redobrada. Não é todo dia que surgem lado a lado um Ford Mustang Shelby GT 500 2013 e seu antepassado de 1968, em um raro tributo ao “encantador de cavalos”, Carroll Shelby, um ex-piloto texano que, depois de ajudar o AC Cobra a se tornar uma lenda, tratou de projetar o primeiro Ford Mustang no final de 1964, usando um motor V8 4.7 de 306 cv. Mal sabia ele que estava forjando mais um ícone.

O ronco nervoso do motor V8 dá as boas-vindas ao encontro da dupla de Shelby GT 500 das safras 1968 e 2013. O ponteiro do conta-giros sobe rápido a 5 000, 6 000, 7 000 rpm. Primeira marcha, acelerador bem aberto, tração para os pneus traseiros. Nada menos que 671 cv são responsáveis por imprimir faixas negras no asfalto. Uma névoa espessa encobre o ambiente em questão de segundos. Quando ela se dissipa, desponta o novo Mustang Shelby GT 500 com traços bem familiares. 

A versão atual não nega a raça. Além da grade do radiador, os faróis redesenhados e as luzes traseiras com LEDs impressionam na parte externa. Comparado com o modelo do ano passado, a cilindrada subiu para 5.8 litros e a potência máxima do V8 passou de 557 para 671 cv. 

Mais alguns metros de aceleração e ele já está perfilado com o Shelby de 1968, um exemplar raro. Afinal, só 47 unidades foram produzidas com o motor 427, três números que já deixam os fãs em posição de oração. Esse V8 não só transformou o Shelby em um supercarro como também realizou o sonho de Henry Ford II em vencer quatro vezes as 24 Horas de Le Mans, de 1966 a 1969. 

Ao dar a partida, é difícil resistir à sedução da velocidade. Batida, rugido, ronco… Um autêntico estrondo heavy metal martela o local a partir de 3 700 rpm. Pouco antes de uma parede de fumaça branca anunciar o excesso de potência, ouve-se um ruído estridente vindo do eixo traseiro. Em seguida, o bloqueio do diferencial garante uma distribuição uniforme de potência às rodas traseiras. O cheiro de borracha queimada dos pneus 215/65 e o ronco do V8 mostram do que ele é capaz. A orgia de força não é sentida pelo motorista apenas em forma de socos. O musculoso Mustang, ao melhor estilo dragster, amortece a traseira e empina o nariz quando se pisa fundo no acelerador.

Antigo ou novo, o Shelby é sinônimo de lembrança de marcas de borracha sobre o asfalto. Entre as versões 1968 e 2013, apenas o comprimento das faixas pretas pintadas no chão deve ter variado. Claro que o atual potro de 671 cv é superior ao antigo, embora não tenha diminuído os 4s9 na aceleração 0 a 100 da versão anterior. Pudera, além do baixo nível de aderência dos pneus desgastados, a temperatura no dia do nosso teste (37 °C) também prejudicou o seu desempenho.

Mas o Shelby Mustang não é somente síntese de motor e potência. O chassi passou por constantes modificações. Na primeira versão de 1965, pontos de articulação dos braços triangulares superiores foram reduzidos em 2,5 cm para obter uma cambagem negativa das rodas dianteiras. Carroll usou ainda molas mais firmes, amortecedores ajustáveis e um estabilizador dianteiro mais grosso. No entanto, muitos clientes reclamaram que essas soluções comuns nas pistas mostravam-se duras demais nas ruas. Assim, a equipe Shelby realizou ajustes muito mais suaves nas versões de 1967 e 1968.

No Mustang 1968, os braços triangulares de metal prensado foram substituídos por tubos de aço soldados. Toda a suspensão dianteira é de um modelo de corrida antigo. Pelos padrões de hoje, o chassi ainda é um pouco subamortecido, mas não esponjoso. O câmbio de 4 marchas Hurst funciona com precisão, apesar da idade. A safra 68 atinge 275 km/h e, por questões de segurança, os freios dianteiros originais de dois pistões foram convertidos para um sistema de quatro pistões oriundo do Lola T70.

O Shelby 2013 também é cheio de endorfina. Com um pacote de desempenho opcional, que inclui diferencial autobloqueante Torsen, estabilizador do eixo dianteiro maior, rodas de raios cruzados de alumínio e amortecedores adaptativos Bilstein, o GT 500 impressiona pela estabilidade até mesmo a uma velocidade de 322 km/h. Apesar da reconhecida tecnologia do chassi, para a equipe de veículos especiais da Ford o ajuste do Shelby GT 500 ainda não chegou à perfeição. E nem poderia: este é mais um desafio para as próximas evoluções da raça Mustang. 

 

Fichas Técnicas

Shelby Cobra GT 500 1968

Velocidade máxima 275 km/h; Aceleração de 0 a 100 km/h 6s6; Consumo médio 5,1 km/l; Motor V8, dianteiro, longitudonal, gasolina; Cilindrada 6 997 cm3; Potência 482 cv a 6 000 rpm; Torque 71,9 mkgf a 3 700 rpm; Câmbio manual, 4 marchas; Tração traseira; Rodas liga leve, aro 15”; Suspensão dianteira e traseira independente, Comprimento 4,74 m; Largura 1,80 m; Altura 1,31 m; Entre-eixos 2,72 m; Peso 1 480 kg

Shelby Cobra GT 500 2013

Velocidade máxima 322 km/h; Aceleração de 0 a 100 km/h 4s9; Consumo médio 5,1 km/l; Motor V8, com compressor; Cilindrada 5 812 cm3; Potência 671 cv a 6 500 rpm; Torque 87,3 mkgf a 4 000 rpm; Câmbio manual, 6 marchas; Tração traseira; Rodas liga leve, 265/40 R 19 (f) e 285/35 R 20 (t); Suspensão independente, Comprimento 4,78 m; Largura 1,87 m; Altura 1,39 m; Entre-eixos 2,72 m; Peso 1 773 kg

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