As fabricantes chinesas continuam a enxergar o Brasil como um mercado com grande potencial para difundir os modelos asiáticos globalmente. A 28ª edição do Salão do Automóvel de São Paulo está aí para comprovar a análise, uma vez que todas as marcas do país trouxeram novidades para cá. Entre todos os desafios que os chineses enfrentam para se firmar no mercado brasileiro, especialmente os que se referem à qualidade, o design é uma das características mais marcantes destes modelos. 

Para tentar compreender quais são as inspirações do estilo chinês, a equipe do CARRO ONLINE convidou Peter Horbury, vice-presidente de design da Geely, para nos ajudar a interpretar as linhas presentes nos modelos da marca. Com um smartphone, o executivo tirou fotos de alguns ângulos de três veículos expostos pela Geely, e, sob o seu ponto-de-vista, destacou os critérios de criação do design. 

DA TRADIÇÃO CHINESA PARA AS RUAS

Faróis, grade frontal e logo da Geely reproduzem face do Panda

O primeiro alvo dos cliques de Horbury foi o hatch de entrada GC 2. Vendido como “Panda” na China e em outros mercados, o compacto é uma tradução “fiel” do urso, segundo o vice-presidente. “A China é um país que exalta muito uma cultura de adoração aos animais, vemos isso inclusive em seus calendários, como o ano do cachorro e do coelho, por exemplo. E o Panda é um dos animais simbólicos para os chineses”. No caso do GC 2, a influência do Panda é vista logo nos faróis. 

Formas circulares da lateral contribuem para criar a imagem amigável do modelo

“Na China, é importante destacar os faróis, porque para os chineses são eles os ‘olhos’ do carro, diferentemente da visão ocidental europeia, pela qual o para-brisa cumpre essa função”, explica Horbury. Portanto, toda a frente do compacto foi desenhada para reproduzir a face do Panda, sendo a grade frontal a “boca” e o logo da marca na ponta do capô o “nariz” do urso. Nas laterais, o executivo aponta que todas as formas são circulares, “para criar uma sensação amigável e agradável, como a imagem que o Panda transmite para as pessoas”. 

Lanternas são cópia fiel da pata do Panda

Atrás, as lanternas compõem a homenagem mais clara ao Panda, pois seu formato é evidentemente uma cópia de sua pata. 

PREVALECEU O CLÁSSICO

No caso do EC 7, os critérios que balizaram seu estilo foram menos autênticos. “Para ele pensamos em algo mais clássico”, revela Horbury. Ainda assim, o carro exibe linhas mais retas, para atender a procura por um pouco mais de esportividade, embora isso tenha causado um dilema durante o desenvolvimento do sedã, porque “os chineses também apreciam formalidades”, de acordo com o executivo.

Sedã EC 7 prioriza linhas mais formais, em vez da esportividade

“Para esta coluna (a C, no caso) nós queríamos priorizar um estilo mais arrojado, dando um caimento mais direto à janela traseira. Em vez disso, decidimos atribuir uma curvatura mais acentuada, quase verticalizada, que remete a uma característica de limousine”, conta Horbury. Além do impacto sobre o design, a medida também serviu para aliviar as finanças da empresa. “Se focássemos na esportividade, a coluna C seria mais fina, obrigando-nos a acrescentar mais uma área envidraçada, o que certamente aumentariam os custos de produção.”

Curvatura da janela remete a uma característica de limousines

Outra solução do design que extrapolou a função estética foi o vinco traçado na lateral do modelo, que se estende das rodas da frente à traseira do carro. “Isto serve para reforçar a proteção da lataria, porque é preciso um impacto maior nesta região para amassar a porta, por exemplo”, explica o vice-presidente.

UM TOQUE ARTÍSTICO

O principal destaque do estande da Geely no Salão, o FE 7 Hybrid, também posou para à câmera de Horbury. Segundo ele, a aposta da marca ao criar o conceito (que já está bem próximo da versão de produção) foi a de proporcionalidade. “O carro todo têm ângulos mais diretos, mais fáceis para a assimilação”. 

Lateral do FE 7 destaca a proporcionalidade das formas do carro

A frente do carro, em V, contribui para que a interpretação de suas linhas seja mais simétrica e é na lateral do carro que se percebe mais a relação proporcional entre a frente, as duas portas e a traseira do veículo. Mesmo com um apelo mais arrojado, Horbury destacou um detalhe mais singelo do crossover.

Contorno dos refletores traseiros foi inspirado em movimentos de pincéis

Os refletores traseiros, situados logo acima do pára-choque, dispõem de um contorno em “L” escurecido que foi pensado para fazer referência às pinceladas delicadas da arte chinesa. “Quanto você usa um marca-texto para escrever um L, você desenha duas linhas paralelas do início ao fim, por exemplo. Mas com um pincel chinês este mesmo movimento resulta em uma linha mais afinada ao final.” 

No interior, a inspiração veio da arquitetura chinesa. Não foi possível conhecer a parte interna do FE 7, mas de acordo com o executivo, o painel do modelo possui uma curvatura que remete às construções de pontes antigas chinesas. “É um design muito bonito e harmonioso, com curvas longas e suaves, que só se vê em pontes históricas”, descreve. 

A missão de Peter Horbury à frente do desenvolvimento de design da Geely não é fácil. Ele é um dos principais responsáveis pela criação da nova plataforma de produção da marca, que compartilhará atributos técnicos e de estilo com a Volvo, que pertence à companhia chinesa desde 2009. Horbury se diz comprometido em tornar os carros chineses mais aceitos no mundo todo, mas se compromete em não abrir mão da identidade asiática. “Minha ambição é fazer o design chinês refletir a cultura da China, porque há 5.000 anos dela e se nós não conseguirmos encontrar algo empolgante neste tempo todo de arquitetura, tem algo errado”, brinca. 

 

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