O japonês Mitsuru Kariya, 48 anos, é o principal responsável pelo desenvolvimento da décima geração do Honda Civic, que acaba de ser lançada no Brasil. Logo após a apresentação do sedã à imprensa brasileira, o engenheiro-chefe (que acompanha o Civic de perto desde a sexta geração, de 1995) conversou com um grupo de jornalistas num hotel de São Paulo. Leia os principais trechos da entrevista:
PERGUNTA – A nona geração do Civic (2011) foi muito criticada e passou por um facelift pouco tempo depois do lançamento. O que houve?
MITSURU KARIYA – Tivemos um problema de limitação de verbas no desenvolvimento da nona geração do sedã. O Japão havia sofrido com o tsunami, que afetou as montadoras de veículos. Já a décima geração foi feita sem limites, totalmente para agradar ao consumidor. Começamos praticamente do zero, tanto no sedã quanto nas outras carrocerias [hatchback e cupê, vendido em outros mercados].
O maior rival do Civic, o Toyota Corolla, líder folgado de emplacamentos de sedãs médios no Brasil, teve sua nova e atual geração lançada antes da do Civic. Vocês tiveram tempo de estudá-la enquanto desenvolviam o Civic 10?
KARIYA – Claro que chegamos a comprar o Corolla atual para conhecê-lo melhor, mas a verdade é que logo desistimos de mantê-lo por perto. Preferimos olhar com atenção para concorrentes de outras marcas.
A versão Touring [topo de gama, 1.5 turbo e preço de R$ 124.900] mostra um Civic mais refinado. Em qual modelo premium vocês se inspiraram?
KARIYA – Com o desenvolvimento do Civic hatch para o mercado europeu, a todo momento eu convivi com modelos de marcas como Audi, BMW e Mercedes-Benz, e com isso acabei tendo em mente que o próximo sedã desenvolvido por mim teria de ter mesmas características delas. Foi muito difícil convencer a alta diretoria da Honda, mas por diversos motivos o Audi A3 foi eleito como base para o projeto do Civic, devido às grandes qualidades dele.
O Civic ficou meio parecido com um Acura, não acha?
KARIYA – Você achou parecido? Pois é, isso tem sido um problema para a Acura [marca de luxo da Honda nos Estados Unidos, cujo modelo ILX divide plataforma com o Civic], já que o nosso Civic está vendendo muito bem (risos).
Você acredita que essa nova geração do Civic terá o mesmo sucesso da oitava, conhecida como New Civic (2006)?
KARIYA – Sim. Posso dizer que o design do novo Civic ficou muito bonito e marcante, com o daquela geração.
O Civic é global, mas o que foi pensado especificamente para o Brasil?
KARIYA – O brasileiro leva muito em conta o tamanho do porta-malas, algo que foi criticado no New Civic. Para essa nova geração observamos essa necessidade e desenvolvemos um espaço melhor. Além disso, foi muito bem discutida a questão do motor flex e a capacidade do tanque de combustível.
Mas como se chegou a um consenso global no desenvolvimento do Civic?
KARIYA – No início, houve uma reunião global da Honda para que todos países envolvidos dessem sugestões sobre o desenvolvimento do Civic, e a partir disso criamos um conceito; então todos foram reunidos novamente para ajustar as ideias e poder desenvolver um Civic que atendesse ao mundo inteiro.
Poderemos ter no Brasil um Civic com assistência para manutenção de faixa e piloto automático adaptativo, sistemas necessários num carro autônomo?
KARIYA – Caso o Brasil necessite dessas tecnologias, o Civic já está preparado recebê-las por aqui, sendo necessário apenas alguns ajustes finos devido à infraestrutura das rodovias locais, mas sem aumentar muito o custo. Temos diversas configurações de carrocerias que são líderes em seus mercados. Com a globalização, caso o Brasil precise de alguma delas nós já estamos preparados para atender a demanda.
O Civic é um carro com certo apelo esportivo. Por que usar um câmbio CVT?
KARIYA – A decisão da Honda em adotar o CVT no Civic é para conseguirmos ter os dois lados bons da dirigibilidade do veículo. Um, é o econômico e confortável, e o outro, a pegada esportiva [com a simulação de sete marchas sequenciais]. São duas configurações de dirigibilidade num único cambio, e tudo isso sem perder a economia de combustível.
Qual foi a maior mudança nesses 40 anos de Civic, e o que virá no futuro?
KARIYA – Antigamente o Civic era exclusivo dentro da marca, mas agora ele tem “concorrentes” em sua própria casa, como o City e o HR-V, que atraem os mesmos clientes. Por isso é necessário muito cuidado na hora de desenvolver, para que ele não seja afetado pelos próprios “irmãos”. Em relação ao futuro, o Civic sempre foi o principal carro da Honda, e creio que ele sempre estará em linha.
Você se considera o “pai” do Civic?
KARIYA – Mesmo estando presente desde a sexta geração do Civic, não me considero o pai dele, mas sim uma pessoa que o ajudou a crescer e se desenvolver.