Mercedes-Benz C111

Quando qualquer aficionado fala em asa de gaivota, a imagem de um Mercedes-Benz 300 SL imediatamente vêm à cabeça. Não é para menos, já que o modelo — que foi produzido entre 1954 e 1957 — tornou-se um ícone, por seu desenho belíssimo, desempenho de tirar o chapéu e, claro, as clássicas (e inusitadas) portas que abrem para cima.

O que nem todo mundo sabe é que a fabricante alemã planejava criar um sucessor para o 300 SL. Iniciado em meados dos anos 1960, o projeto recebeu o nome-código C111 e seu objetivo seria competir com modelos como a Ferrari Daytona e o Lamborghini Miura. O trabalho ficou a cargo de Rudolf Ulenhaut, engenheiro-chefe da empresa, que tratou de projetar um veículo que, como ele mesmo definiu, seria um esportivo simples e prático, e que encantaria pela dirigibilidade. Ulenhaut ainda apregoava que o futuro modelo poderia ser conduzido por qualquer motorista e em qualquer via.

O estilo das portas não eram coincidência. O C111 deveria suceder o 300 SL

Um detalhe importante: Rudolf Ulenhaut já havia trabalhado no desenvolvimento do 300 SL desde os primeiros ensaios do carro, incluindo os testes da versão de competição, que participou e venceu a 24 Horas de Le Mans de 1952 em sua categoria. Não era de se estranhar, portanto, que o “Asa de Gaivota” exibisse um comportamento tão restritivo. Ele era um carro de pista homologado para trafegar em ruas e estradas. 

Versatilidade. O C111 nasceu para ser dirigido por qualquer um em qualquer lugar

O engenheiro-chefe pretendia criar um modelo prático, mas, contraditoriamente, decidiu que o primeiro protótipo seria equipado com um motor rotativo Wankel — que utiliza rotores com fomato triangular em vez de pistões, capaz de produzir 280 cv. O primeiro protótipo foi apresentado oficialmente ao público no Salão de Frankfurt de 1969 e tornou-se o destaque do evento. Ainda mais pela chamativa cor laranja adotada.

Mercedes-Benz C111

O desempenho do bólido, de acordo com a fábrica, era impressionante: o C111 conseguia acelerar de 0 a 100 km/h em 4s8 e podia atingir 260 km/h de velocidade máxima. Além disso, o modelo era o primeiro com motor Wankel a possuir injeção direta de combustível. Naquela época, ainda não se pensava em substituir os carburadores, mas, para a Mercedes, a apresentação do C111 representava uma oportunidade para demonstrar vanguarda tecnológica.

Mercedes-Benz C111

Também por esse motivo, algumas unidadesconstruídas posteriormente contavam com duas velas de ignição, com o intuito de melhorar o consumo de combustível, reconhecido ponto fraco do motor criado pelo alemão Felix Wankel. E se consumia bastante, a emissão de poluentes, naturalmente, também era elevada. A ponto de, segundo alguns, ser impossível ficar próximo do escapamento do carro durante as acelerações sem sentir os olhos arderem e a respiração sufocar devido aos gases. 

Jovens, crianças, não importa o público. Todos queria admirar o inovador Mercedes

Mas a Mercedes prosseguiu com o desenvolvimento do carro, e o protótipo seguinte trazia um motor ainda mais potente, com quatro rotores em vez de três, 380 cv e capaz de levar o cupê a superar os 300 km/h. E é esse modelo que temos a oportunidade de conduzir agora, 45 anos após seu surgimento. O motor Wankel, porém, deu lugar a um “modesto” V8 de 3,5 litros, com 200 cv. Mas, de resto, é o C111 “série II” original. A posição de dirigir, por exemplo, é impecável, como em todo esportivo alemão. Ele não exige qualquer peripécia ou acrobacia por parte do motorista para se acomodar ou dirigir. Todos os instrumentos e comandos estão no lugar em que deveriam estar, bem ao alcance dos olhos e das mãos. 

Níveis e ruído e emissões elevados fizeram a marca substituir o motor Wankel original por um V8 de 200 cv

O melhor é que nem mesmo Hans-Dieter Seufert, o autor das imagens desta reportagem, que mede mais de 1,80 m, ficou desconfortável a bordo do cupê. O C111 acomoda motoristas de todas as estaturas com conforto e uma ergonomia exemplar, como é praxe nos carros alemães. 

Por falar nisso, ao trafegar pelo centro de Stuttgart durante a sessão de fotos em uma noite agradável do verão europeu, não foram poucos os pedidos para admirar melhor a máquina laranja. “Quantos cavalos tem?”, “qual a velocidade máxima?” e o indefectível “quanto custa?” foram as perguntas mais ouvidas.

Mas é preciso lembrar que este bólido não tem preço, é um carro feito apenas para ser admirado e pertence ao acervo do Mercedes Museum, assim como as outras dez unidades que ainda existem do C111.

Mercedes-Benz C111

É hora, então, de acionar o motor. O V8 ronca majestoso, mas no interior do cupê a sensação de tranquilidade impera. A embreagem é surpreendentemente leve, e o carro é extremamente fácil de ser manobrado. Outro detalhe que chama a atenção é o comportamento do carro durante as fotos, quando é preciso deixar o motor ligado durante muito tempo com o carro parado. Nada de anormal acontece. Se fosse um Lamborghini Muricélago, por exemplo, o alarme da temperatura do motor estaria soando há muito tempo. 

Na estrada, chamou a atenção o comportamento impecável do C111, proporcionado pela suspensão (triângulos superpostos na dianteira e multibraço atrás) e também pela aerodinâmica refinada. Para se ter ideia, as saídas de ar dianteiras (no capô) garantem, segundo a Mercedes-Benz, 20% a mais de downforce.

Mercedes-Benz C111

Diz a lenda que o C111 só não entrou em produção comercial graças a um voto contrário no conselho de diretores da Mercedes (a contagem estava empatada). A partir daí, o modelo transformou-se em um laboratório ambulante, onde foram testadas várias tecnologias, além de ser usado para quebrar recordes.

Seja como for, a Mercedes tem o mérito de, ao menos, preservar os protótipos construídos como parte de sua história. E melhor ainda: permitir a jornalistas, como nós, ter o privilégio de conduzir um desses exemplares a fim de narrar essa experiência única a você.

Mercedes-Benz C111

Uma história sem um final (muito) feliz  

Como o motor Wankel se tornou inviável, a Mercedes tentou equipar o C111 com um propulsor a diesel para torná-lo viável, mas, no fim, a empresa decidiu transformá-lo em um “quebrador de recordes”. Em 1978, por exemplo, o C111-IIID rodou durante 12 horas com a incrível média (até hoje) de 316 km/h na famosa pista circular de Nardò, na Itália. Em seguida, o modelo (com novas modificações aerodinâmicas), tornou-se o mais rápido a completar 100 km, conseguindo uma velocidade média de 375,5 km/h! Tudo isso nos anos 1970… 

As três gerações do protótipo

FICHA TÉCNICA

Motor V8, dianteiro, longitudinal, gasolina; Cilindrada 3.499 cm³; Potência 200 cv; Torque 29,2 mkgf; Câmbio manual, 5 marchas; Tração traseira; Rodas Liga leve, 14”; Suspensão dianteira triângulos superpostos; Suspensão traseira multibraço; 

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