Desde que chegou ao mercado, em 2009, o Fiat Punto T-Jet (1.4 a gasolina) não tem um rival com motor turbinado à altura. Nos últimos anos, o hatch esportivo teve a concorrência de modelos aspirados mais fracos (como Ka XR/Sport e Sandero R.S.) ou de turbos mais caros, incluindo os “irmãos” Bravo T-Jet e 500 Abarth. Isso deu à Fiat um conforto que finalmente vai acabar com a chegada do 208 GT. 

O novo Peugeot apimentado adota a receita do ótimo 2008 THP — incluindo o motor 1.6 turbo de 173 cv (etanol) — num pacote mais leve e menor. A fabricante revelou seu preço na noite desta segunda-feira (4): R$ 78.990.  

Peugeot 208 GT com motor turbo: virou uma fera

Para ser preciso, o 208 GT vai pegar nos calcanhares do rival, já que o Punto T-Jet parte de R$ 75.300. A lista de itens de série do Fiat, porém, é inferior à do Peugeot. Equipado como o rival, o Punto passa a custar mais de R$ 83.100, mas itens como controle de estabilidade e ar-condicionado de duas zonas não são oferecidos nem como opcionais. Vale ressaltar que o custo-benefício de um compacto esportivo não tem tanto peso na hora da compra quanto em um Peugeot 308 ou Fiat Toro, ainda que estejam na mesma faixa de preço.

Enquanto o cliente de um modelo “esportivado” busca apenas o visual diferenciado, quem coloca na garagem um carro com suspensão dura e motor potente quer andar forte (o que não é sinônimo de irresponsabilidade ao volante). Leves e ainda abaixo dos 200 cv, essa dupla de hatches diverte até mesmo em marcha-lenta.

“GRIPE” DE VOLTA
Mesmo longe dos 180 cv da versão europeia Essesse, o Punto T-Jet tem um ronco encorpado, bem distante do som abafado das versões 1.6. No quesito som ele agrada, mas o 208 GT vai além. Além da cilindrada maior, que favorece o ruído mais grave, a Peugeot acertou a mão com o escapamento – sem falar no melhor do turbo. 

Pintura vermelha destaca mudanças sutis na personalização do GT

Em carros como up! TSI e Golf 1.4 a turbina está lá mais para ajudar o motor a atender às normas de emissões e reduzir o consumo do que para entregar um desempenho esportivo. Por isso, em muitos casos, nem é possível ouvir o característico “espirro” em trocas de marcha.

No Punto, o som do ar pressurizado é mais discreto, mas perceptível, sobretudo com os vidros abertos. Já o 208 não esconde suas “más intenções”, com o barulho intenso da admissão e posterior despressurização, sempre que o motorista acelera com mais vigor. Para quem faz questão do estilo esportivo, isso faz diferença. 

A indiscrição sonora do 208 GT destoa do visual mais sóbrio do esportivo, justamente o contrário do que acontece no Punto T-Jet. O Fiat é idêntico ao modelo europeu, que lá é vendido pela divisão esportiva Abarth. Por isso, tanto o para-choque dianteiro quanto o traseiro exibem uma profusão de entradas e saídas de ar, nem sempre funcionais. A ideia é mostrar de longe que seu Punto não é qualquer um, mas um T-Jet.

Os apliques vermelhos na grade do radiador e as rodas diamantadas de 17” diferenciam o GT dos outros 208 reestilizados, mas não tanto quanto ocorre no Punto.

Por dentro, os dois ficam mais próximos, pelo menos no visual. Pedaleiras esportivas, bancos de couro com costura aparente e o conhecido volante com base achatada estão presentes nos dois. O T-Jet é ligeiramente mais ousado e tem painel com cores contrastantes, manopla do câmbio e bancos exclusivos. O 208 GT, porém, se diferencia das demais versões onde mais importa.

Motor 1.6 turbo do Peugeot gera 173 cv e 24,5 kgfm

Nas fotos, o interior do 208 GT é bem parecido com o das demais versões. Os mais atentos vão notar a borda do quadro de instrumentos com luzes vermelhas de LED e mostradores analógicos do nível de combustível e da temperatura do motor. A Peugeot optou por adotar mostradores digitais no 208 nacional, mas como o GT usa os instrumentos do modelo europeu, os ponteiros extras vieram a tiracolo.

Ninguém vai assinar um cheque de mais de R$ 75.000 por isso, então a marca foi além e adotou material emborrachado no painel e no forro de portas. Isso deixou o GT não só com um acabamento superior ao das demais versões, como também do Punto T-Jet e seu painel bicolor.

No Fiat, os bancos dianteiros têm mais apoio lateral, sobretudo no assento. Mas a virtude vira um problema para os gordinhos: as bordas são tão altas que incomodam. O assento do GT é mais tolerante com quem está acima do peso.

PREPARADOS DE FÁBRICA
Antes de instalar um motor mais potente, não se pode esquecer de adequar o conjunto mecânico à proposta esportiva. Por isso molas, amortecedores e freios (a disco nas quatro rodas) foram modificados, tanto no T-Jet quanto no 208 GT.

Fiat Punto T-Jet custa R$ 75.300

Isso deixa os carros, naturalmente, mais desconfortáveis no dia a dia, mas os “genes” macios da Fiat deixaram o Punto mais confortável. Ele ainda sacode com certo vigor nas ondulações, mas não entrega as batidas secas perceptíveis no GT, cujo modelo do qual deriva já tem suspensão mais firme. Em compensação, a direção com assistência elétrica do Peugeot oferece uma agilidade superior ao esportivo 1.6. 

Apesar dessas pequenas diferenças, na hora de fazer curvas a dupla empolga. Mesmo mudanças bruscas de direção não são capazes de tirar os hatches do prumo e, no limite, ambos apresentam um certo subesterço, mais previsível e seguro do que uma saída de traseira. A eficiência da suspensão e da direção fica evidente pelo ESC do 208, que praticamente só entra em ação em acelerações intensas. 

Isso, aliás, é o que o Peugeot faz de melhor. Além de ser mais potente, ele é mais leve que o T-Jet. Em nossos testes, o 208 GT acelerou, retomou e freou melhor que o Punto. Tudo bem que os 1s6 que separam a dupla na prova de 0 a 100 km/h servem mais para alimentar discussões em rodas de bar do que para definir uma compra, só que, na prática a diferença é ainda maior.

No Fiat, a sensação é que sobra suspensão, freio e direção em relação ao motor. Enquanto estava sozi­nho na categoria, isso não era problema, mas agora, a chegada de um concorrente criou uma saudável – e interessante – disputa.

Quem sai do T-Jet e entra no 208 GT notará o enorme degrau de desempenho logo na primeira aceleração. O motor THP desenvolvido em parceria com a BMW entrega a maior parte do seu vigor a partir das 1.800 rpm, e sobe rápido após isso. O “atraso” do turbo no T-Jet é maior, e a cilindrada menor deixa o desempenho do Punto abaixo das 2.000 rpm quase anêmico.

Rodas de liga leve de 17 no Punto esportivo

Dá gosto acelerar o GT, mas – como sempre – dava para o hatch ser melhor. O curso da alavanca de câmbio é longo, e a impressão de precisão, ainda que superior ao do Fiat, não é a que se espera em um modelo que ocupa a faixa de preço do 208 GT.

A vantagem do câmbio do 208 está na sexta marcha, que nunca foi oferecida no Punto T-Jet nacional. Além de permitir um menor degrau entre as marchas, a sexta deixou o GT mais silencioso que o Fiat a partir de 100 km/h. Não pudemos avaliar o consumo de combustível do Peugeot, mas os números preliminares indicam que ele não terá a mesma “sede” do 2008 THP. E, mesmo que não melhore muito os 8,7 km/l médios do SUV, ele ainda tem a vantagem de ser flex, ao contrário do Punto T-Jet.

Outra vantagem do GT está no projeto mais novo do 208, que chegou ao Brasil seis anos depois do Punto. A arquitetura mais moderna deu à Peugeot a possibilidade de adotar itens inexistentes no T-Jet, como o teto solar panorâmico, que, apesar de ser fixo, é maior e interfere menos na área para a cabeça dos ocupantes, especialmente de quem viaja atrás.

O conceito do i-Cockpit, que faz com que o motorista veja o quadro de instrumentos por cima, e não através do volante, não agrada a todos, mas ajuda o motorista a encontrar a melhor posição para dirigir. 

CONFORTO DIÁRIO
Por mais que o foco dos dois hatches seja a esportividade, isso não significa que seus proprietários vão trocar as marchas no limite de giro a cada curva ou saída de semáforo. Por isso, as fabricantes escolheram caminhos distintos para tentar agradar aos seus clientes.

Visual da cabine do Punto já denuncia idade avançada do projeto

Por ser mais antigo, o T-Jet não possui uma central multimídia moderna. O sistema UConnect é o mesmo da Toro, com uma tela de LCD de baixa resolução e dimensões compactas. Seu controlador de velocidade não possui função de limitador e o sensor de estacionamento só monitora a traseira.

Quem já se habituou ao 208 vai se adaptar rápido ao GT, que vem ainda mais recheado que o antigo topo de linha Griffe 1.6 automático. Entre seus diferenciais há luzes de condução diurna de LED, faróis de neblina com acendimento automático em curvas, ESC com assistente de partida em rampa e sensores de estacionamento dianteiros. A central multimídia manteve a mesma posição e tamanho do modelo anterior, mas recebeu as atualizações já disponíveis no 2008, e agora oferece espelhamento para alguns modelos de smartphone Android e iOS.

Talvez o principal problema do 208 GT seja o nome que o precede. Por mais que a Peugeot tenha reforçado em seus anúncios o fato de ser uma fabricante nacional e investido em pacotes de revisão com valores fechados, ainda há o preconceito de se ter um “carro francês”. O problema, reconhecido pela marca, se reflete na desvalorização elevada e na eventual maior dificuldade de revenda. Some-se a isso o seguro mais caro cobrado de carros esportivos, e o negócio fica menos atraente.

Medições realizadas na pista de testes da ZF-TRW, em Limeira (SP)

Uma solução é o interessado aguardar a chegada das primeiras unidades do 208 GT ao mercado de seminovos, o que amortizaria parte da perda no valor inicial do carro. A outra é mandar às favas os preconceitos (e parte do dinheiro investido) para adquirir um dos melhores esportivos abaixo dos R$ 100 mil oferecidos no Brasil.

Isso não significa que o jogo esteja perdido para a Fiat. A próxima geração do Punto, de código X6H, está na fase final de desenvolvimento e deve ser lançada entre o final deste ano e início de 2017. Não se sabe se a marca vai investir em uma nova versão T-Jet, mas se o 208 GT vender tanto quanto ele diverte, a FCA precisará responder à altura. Quando isso ocorrer, teremos o prazer de promover a revanche deste duelo.

Fichas do 208 GT e do Punto T-Jet (reportagem completa na CARRO #270)

A VITÓRIA É DO 208 GT
Quase nenhuma fabricante investe no segmento de esportivos compactos de verdade no Brasil, especialmente com motor turbo. O Fiat Punto T-Jet reinou sozinho nessa categoria e a marca acabou deixando de investir o suficiente no compacto, que poderia ter itens como ESC e ar-condicionado de duas zonas desde o seu lançamento, equiparando-se ao modelo europeu. A aposta arriscada da Peugeot, marca que ainda não detém uma reputação de pós-venda igual à da Fiat, vem a calhar, especialmente em um momento de crise no mercado automotivo. O 208 GT entrega o desempenho que todo fã de esportivo espera, com uma lista de equipamentos de série à altura do investimento de quase R$ 79 mil, além de ter um visual mais atualizado.

Share This