Maior entre os SUVs compactos, Honda HR-V sobe de categoria com motor 1.5 turbo e desafia a versão flex mais vendida do líder Jeep Compass
Apesar do Honda HR-V ser visto como rival direto dos SUVs compactos (Hyundai Creta, Jeep Renegade, Nissan Kicks, VW T-Cross etc.), ele tem dimensões externas maiores que todos eles, o que o deixa em um certo limbo entre duas categorias. Ao relançar a versão Touring, ausente da gama desde 2017, a estratégia da Honda foi mirar em SUVs de segmento logo acima, como Peugeot 3008, VW Tiguan Allspace 250 TSI, Hyundai ix35 e as versões flex do Jeep Compass.
Para fazer o HR-V subir de divisão, a fabricante japonesa municiou seu SUV com equipamentos de série distintos e um novo coração: o motor 1.5 turbo quadricilindro a gasolina, o mesmo do Civic Touring, capaz de gerar 173 cv a 5.500 rpm e torque de 22,4 kgfm constantes entre 1.700 e 5.500 rpm. O valor na etiqueta, contudo, também mudou de categoria: o HR-V Touring custa R$ 139.900.
Nesta edição, comparamos o Honda com o Jeep Compass Longitude Flex (R$ 127.990), responsável por aproximadamente 40% das vendas de sua gama e líder de vendas entre todos os SUVs em território nacional em 2018. Será que o japonês turbinado é páreo para o atual campeão “peso por peso” da modalidade com todas as suas armas?
Valor agregado
Para equiparar o preço dos dois modelos, consideramos todos os opcionais contidos no Compass Longitude Flex cedido pela FCA para este teste. São eles o acabamento em couro claro, faróis em xenônio com acendimento automático, sensor de chuva, retrovisor interno eletrocrômico, sistema de som Beats de 506 W e cinco airbags adicionais: de joelho para o motorista, laterais e de cortina, totalizando sete, um a mais que o HR-V. Somados, mais a pintura perolizada, seu preço fica quase idêntico ao do Honda: R$ 139.390.
Externamente, o que distingue o HR-V topo de linha da versão EXL são o teto solar panorâmico de série, os faróis full-LED, o logotipo “Turbo” e a saída dupla de escapamento – que exigiu mudanças no assoalho e diminuiu o porta-malas de 437 para 393 litros, deixando-o menor que os 410 litros do Compass. Até mesmo as rodas são comuns às demais versões.
Há a opção de revestimento interno em bege se a pintura externa for azul, cinza metálico ou branco perolizado, mas os demais detalhes no habitáculo para se diferenciar das versões inferiores são discretíssimos, como a costura dupla do forro das portas e a iluminação em LED. O painel de instrumentos também segue exatamente o mesmo, com conta-giros e velocímetro analógico (de boa visualização, ressalte-se, mas sem repetidor digital) e um computador de bordo simples em uma tela monocromática acionado por botão de seleção no próprio painel – este ganhou marcador de vida útil do óleo do motor, mas em recursos fica aquém dos oferecidos pelo Compass e até de outros modelos com valor menor.
Naquilo que poderia ser sua maior desvantagem quando comparado a um modelo maior, o HR-V se sai muito bem: suas medidas de espaço interno são quase idênticas às do Compass, mesmo sendo mais curto (4,32 m do Honda contra 4,41 m do Jeep), menor no entre-eixos (2,61 m versus 2,63 m), mais estreito (1,77 m contra 1,81 m) e mais baixo (1,58 m contra 1,63 m). Todos os ocupantes se acomodam confortavelmente em qualquer um dos dois adversários, mas em ambos se sente a ausência de ajuste elétrico do banco do motorista.
O Honda ganha ponto extra pela opção de rebatimento para cima dos assentos dos bancos traseiros, o que compensa em parte a perda dos 44 litros no compartimento de bagagem. O Compass dá o troco na instrumentação mais completa, com computador de bordo de ampla gama de funções (o mesmo de outros modelos Fiat e Jeep), na saída de ventilação para os bancos traseiros e na central multimídia Uconnect, que abriga, entre outros recursos, o ajuste do ar-condicionado digital.
Força máxima
Dados os números de seu novo motor, não é surpresa que o HR-V Touring tenha virado um canhão. Em nosso teste na pista da ZF em Limeira (SP), o novo SUV turbo da Honda acelerou de zero a 100 km/h em excelentes 8s38 – apenas 0s6 mais lento que o Civic com o mesmo motor e 2s7 mais rápido que o HR-V EXL 1.8 abastecido com etanol. Isso ocorre graças à relação peso-potência de 7,98 kg/cv e ao torque máximo quase imediato.
Se comparado ao Jeep Compass Longitude Flex abastecido também com gasolina, o contraste é imenso. O modelo fabricado pela FCA em Goiana (PE) fez o zero a 100 km/h em 12s36, quase 4s mais lento. Nas três provas de retomada, o HR-V turbo foi em média 3s6 mais rápido, sendo que na prova de 60 a 120 km/h o Honda foi 4s73 mais rápido que o Jeep.
A relação peso-potência do Compass Flex usando gasolina é de 9,69 kg/cv. Nâo é ruim, mas o pico de 159 cv (ou de 166 cv no etanol) do motor 2.0 Tigershark aparece apenas a 6.200 rpm. Já o torque máximo de 20,5 kgfm vem a 4.000 rpm, enquanto o HR-V turbo já está a pleno muito antes. Isso influencia não só o desempenho máximo como na oferta de força nas faixas de rotação mais usadas principalmente no tráfego diário.
Ainda mais quando abastecido somente com gasolina, o Compass Flex parece excessivamente anestesiado ao acelerador. Arrancadas e mudanças de faixa para ultrapassagens devem ser feitas progressivamente, sem pressa, ou usando constantemente as borboletas atrás do volante para comandar manualmente o câmbio automático de seis marchas. Em Drive, a resposta demora mais do que deveria mesmo no kickdown e, quando vem, o câmbio escolhe relações muito curtas – em algumas retomadas a 70 km/h, chegou a engatar a 2ª marcha. Requer costume.
Percebe-se que é uma escolha de calibração de resposta priorizando o perfil de público e, também, economia de combustível – o que se reflete principalmente em autoestradas. Dentro dos padrões de teste da Revista CARRO (mesmos percursos, mesmo piloto, mesmo combustível e ar-condicionado desligado), o Compass Flex com gasolina (e sistema stop-start ligado) atingiu 7,8 km/l na cidade e 13,2 km/l em rodovia. Mesmo sem stop-start, o HR-V Touring foi bem melhor em percurso urbano (10,6 km/l), mas a diferença no rodoviário foi menor (14,7 km/l).
Considerando as médias PECO (10,2 km/l para o Jeep e 12,4 km/l para o Honda), o Compass Flex pode percorrer 612 km com gasolina sem reabastecer – contra 632 km do HR-V, mesmo com nove litros a menos de capacidade no tanque (51, contra 60 do Jeep). Tudo por causa de um motor com uma concepção mais eficiente, que combina injeção direta de combustível e turbocompressor, coisas que o motor da Fiat Chrysler não possui.
Vocações distintas
Deu para perceber que a vocação do Jeep Compass Flex é para longas distâncias, em velocidade de cruzeiro constante – e tanto o acerto de suspensão quanto o de direção acompanham essa tendência. Por isso, é de se esperar que as respostas ao volante sejam mais lentas e o acionamento dos freios, mais progressivo, até porque os pneus do Jeep também são maiores (225/55R18 contra 215/55R17).
Na pista, o Compass precisou de mais espaço nas provas de frenagem a frio (45,04 m de 100 km/h a zero, contra ótimos 38,48 m do HR-V), mas o fading foi ótimo para um veículo de 1.541 kg com carroceria alta: apenas 71 cm em dez passagens de 100 km/h a zero com 200 kg de carga. Já o HR-V Touring, apesar de mais de 100 kg mais pesado que a versão EXL 1.8, teve praticamente os mesmos resultados de frenagem que sua variante com motor de aspiração natural, exceto pelo fading um pouco superior, ainda bons 1,44 m.
Esse peso extra do HR-V com o novo trem de força não prejudica em nada sua dirigibilidade –pelo contrário. Com a mudança de motor, o SUV da marca japonesa recebeu ajuste específico com molas e amortecedores recalibrados e barra estabilizadora dianteira de maior diâmetro.
Ambos possuem controle de velocidade de cruzeiro e auxílios à direção, como controles de estabilidade e tração. Enquanto o Compass Flex pode vir com controle de estabilidade para trailler quando equipado com engate, o HR-V turbo ganhou sistema de vetorização de torque, que freia a roda dianteira interna da curva a fim de facilitar o contorno e diminuir o subesterço (saída de frente).
Enfim, a grande questão que precisa ser respondida: o Honda HR-V Touring convence como SUV urbano médio quando justaposto com o líder desse segmento? Se você olhar para o modelo da marca japonesa sem uma opinião pré-formada e confrontar os dados friamente, a resposta é sim. Mas é impossível ignorar o elefante na sala – seu preço, exatos R$ 28 mil acima da versão EXL 1.8. Como referência, a diferença do Civic EXL 2.0 para o Civic Touring é de R$ 22.300, partindo de bases equivalentes à gama do SUV. Com a palavra, o consumidor brasileiro.
Fotos: Renan Senra