T-Cross marca a entrada da Volkswagen no segmento de SUVs compactos. Será ele páreo para os líderes Creta, HR-V e Kicks?
Se você não é fã dos atuais SUVs, tenho uma boa e uma má notícia. Primeiro, a “ruim”: esse segmento ainda tem fôlego e deverá continuar a crescer por, pelo menos, mais quatro anos. É o que indica a Volkswagen, que projeta crescimento de 70% no volume de vendas desse tipo de veículo na América Latina até 2022.
A boa notícia é que, se você torce o nariz para os SUVs por alguma desconfiança em relação a prazer ao dirigir, pode rever sua opinião. Com o avanço da engenharia e da tecnologia, os utilitários esportivos atuais em nada lembram os modelos do passado. A safra mais moderna reúne dirigibilidade muito mais próxima a de hatches médios do que a de utilitários dos anos 2000.
O mais novo representante da seara dos SUVs compacto é o Volkswagen T-Cross, que finalmente marca a entrada da marca de origem alemã neste lucrativo segmento. Para colocar à prova o poder de fogo do novo modelo, alinhamos ele às versões de topo dos três rivais mais vendidos em 2018. São eles, na ordem do ranking: Hyundai Creta, Honda HR-V e Nissan Kicks. Também pretendíamos reunir nesta disputa o Jeep Renegade, quarto mais emplacado no ano passado, mas a FCA não dispunha do modelo para empréstimo. Veja a seguir quem entrega o maior equilíbrio entre os números de desempenho, consumo, espaço interno e custos após a compra.
4º – Nissan Kicks SL
O Kicks traz como principal vantagem o menor preço de compra entre o trio aqui reunido: ele é o único com tabela da versão de topo abaixo da barreira psicológica dos R$ 100 mil. Por R$ 99.990, a configuração SL traz seis airbags, controles de estabilidade e tração, assistente de saída em rampas, bancos em couro, chave presencial, botão de partida do motor e ar-condicionado digital, entre outros itens.
A versão avaliada traz ainda o Pack Tech, que acrescenta alerta de colisão, assistente inteligente de frenagem e faróis com assinatura em LED por R$ 2.400 extras. Apesar disso, o Kicks peca pela falta de alguns itens básicos. Ele é o único com faróis de parábola simples e não traz opção de controle de cruzeiro, algo que até mesmo um Chevrolet Onix LTZ (R$ 58.690) possui.
Na cabine, o Kicks é o único a trazer painel revestido com o mesmo couro dos bancos – no HR-V, que utiliza solução semelhante, a superfície tem material menos nobre. O Nissan agrada ainda pela tela digital no quadro de instrumentos e o volante de ótimo encaixe para os dedos e base achatada. Já o mesmo não pode ser dito da qualidade do revestimento do teto, simples demais, e da usabilidade da central multimídia de 7 polegadas, a menos intuitiva do grupo. Ao menos ela integra o prático sistema de câmeras 360º, que facilita a vida do motorista na hora de estacionar.
O Nissan tem o motor de menores potência e torque no grupo, com 114 cv e 15,5 kgfm, valores com etanol ou gasolina. Mesmo com 134 kg a menos que o HR-V, o segundo mais leve do quarteto, o Kicks ficou com a lanterna nos ensaios de aceleração e frenagem. Ele cumpriu a prova de zero a 100 km/h em 11s8, ante 11s1 do Honda. Nas retomadas, ele foi o único a passar da casa dos 10 segundos no ensaio de 60 a 120 km/h, com 12s4 registrados.
Com 41,9 metros percorridos até estancar completamente vindo a 100 km/h, ele parou 2,6 m depois que o segundo pior colocado na mesma prova, o Creta (39,3 m) – ambos são os únicos com freios a tambor no eixo traseiro.
Deixando a frieza dos números de lado, o Kicks agrada na experiência ao volante. A direção é leve em manobras e ganha peso adequado em velocidade de cruzeiro. A suspensão também cumpre muito bem o equilíbrio entre conforto em pisos ruins e estabilidade em curvas. O câmbio continuamente variável (CVT) faz bom trabalho para extrair a potência do motor, embora falte a ele opção de trocas de marchas virtuais como há no HR-V. Este recurso mostra-se útil para reduzir velocidade antes de entrar em uma curva, poupando o sistema de freios. No Kicks, há somente o discreto botão Sport (que eleva as rotações) e a posição Low (para obter máximo freio-motor).
Se na comparação de desempenho o Kicks fica para trás dos rivais, em consumo o jogo fica mais favorável ao SUV produzido em Resende (RJ). Ele obteve as segundas melhores médias do comparativo na cidade (7,6 km/l) e estrada (11,5 km/l), perdendo apenas para o T-Cross por 0,5 km/l na média PECO. A combinação entre “sede” comedida e o menor preço de compra garantiu ao Kicks a vice-liderança na análise de mercado (veja quadros ao final da matéria). Na soma geral, entretanto, o Nissan registrou 265,5 pontos, o que dá a ele a 4ª colocação.
3º – Hyundai Creta Prestige
O HB20 inaugurou a produção nacional da Hyundai sob comando da matriz sul-coreana, em 2012, época em que as referências entre carros compactos eram Volkswagen Gol e Fiat Palio, à época com soluções defasadas. Já o Creta estreou no início de 2017 e encarou concorrência muito mais acirrada logo de cara, uma vez que o mercado de SUVs tinha nomes fortes como HR-V, Renegade e Kicks, entre outros. Ainda assim, o Hyundai mostrou força ao fechar 2018 como o SUV compacto mais vendido do País.
A versão aqui fotografada é a Pulse Plus 1.6 (R$ 92.990), enquanto a configuração considerada em todo o comparativo é a topo de linha Prestige 2.0 (R$ 104.900), que não estava disponível para empréstimo no dia do ensaio fotográfico. Por esse valor, o Hyundai vem de fábrica com chave presencial, botão de partida, seis airbags, controles de estabilidade e tração, assistente de saída em rampas, monitoramento da pressão dos pneus e bancos em couro na cor marrom, entre outros.
Como diferenciais, o Creta traz saídas de ar-condicionado para o banco traseiro (também presentes no T-Cross) e o exclusivo sistema de ventilação no banco do motorista com três níveis de intensidade. A central multimídia convence quanto à rapidez nas respostas aos comandos e conta com navegação GPS integrada, TV digital e compatibilidade com Apple CarPlay e Android Auto. O Creta agrada ainda pelo espaço na cabine, com as maiores área para a cabeça dos ocupantes e largura do banco traseiro. O tamanho do porta-malas também satisfaz, com 431 litros.
O Hyundai é o mais potente do grupo, com 166 cv, o que lhe confere a melhor relação peso-potência do comparativo, de 8,4 kg/cv. Em torque, é o segundo mais forte, com 20,5 kgfm. Porém, isso não foi suficiente para garantir a liderança na aceleração de zero a 100 km/h. Com 9s7, o Creta ficou com o segundo melhor tempo. Nas frenagens, o Hyundai garantiu intervalo inferior a 40 metros na prova de 100 a zero km/h, mas precisou de mais espaço que HR-V e T-Cross.
O SUV produzido em Piracicaba (SP) fica ligeiramente para trás dos concorrentes aqui reunidos em comportamento dinâmico. O ajuste de suspensão voltado ao conforto faz o Creta apresentar maior rolagem da carroceria, ainda que de forma controlada e sem sustos ao motorista. O bom isolamento acústico garantiu a ele o menor ruído interno com o carro parado – com 35,8 dB, foi 5,5 dB mais silencioso que o Kicks na mesma condição.
Ponto mais sensível do Creta é o consumo de etanol, com as piores médias do comparativo: 6,2 km/l em ambiente urbano e 8,5 km/l no ciclo rodoviário. Mesmo com o maior tanque de combustível, a autonomia estimada de 396 km na média PECO só não é menor que a do Kicks (373 km), graças ao diminuto reservatório de 41 litros do Nissan.
Único com cinco anos de garantia de fábrica (ante três dos demais), o Creta tem o maior custo de manutenção programada até os 30 mil km, com preço sugerido de R$ 1.441 (Honda e Nissan cobram R$ 170 a menos, enquanto no Volkswagen as três primeiras paradas são gratuitas). No cômputo entre as notas das análises técnica e de mercado, o Creta fica com 276,5 pontos e garante o 3º lugar.
2º – Honda HR-V EXL
A versão de topo do HR-V custa R$ 108.500, o segundo maior preço de partida do grupo. O único opcional, entretanto, é a pintura metálica, por R$ 1.500 extras. A linha 2019 do Honda trouxe faróis de bloco elíptico para o facho baixo e luzes de rodagem diurna em LED. Este mesmo material substituiu as lâmpadas comuns nas luzes de posição e de frenagem traseiras.
Outro upgrade da reestilização é o novo formato dos bancos dianteiros, com melhor apoio para coxas e tronco – junto ao Kicks, o Honda é o mais confortável neste aspecto. Exclusividade do HR-V é o sistema de múltiplos arranjos do banco traseiro, que permite não só o rebatimento dos encostos, como também a elevação dos assentos. A acomodação do quinto passageiro, porém, é a menos cômoda do quarteto aqui reunido.
O Honda é o único com freio de estacionamento de acionamento eletromecânico, o que permite a aplicação do cômodo sistema de retenção automática dos freios (Brake Hold). Porém, o HR-V decepciona pela simplicidade do quadro de instrumentos, que traz uma diminuta tela monocromática para dados do computador de bordo – ele é o único sem repetidor digital do velocímetro.
O SUV da Honda também fica atrás dos concorrentes por ser o único a não oferecer nem como opcionais chave presencial, botão de partida do motor e sensor de estacionamento traseiro. Ao menos o acabamento interno satisfaz, com boa escolha de materiais. O mesmo não se aplica ao cofre do motor, com ausência de pintura e massas de vedação expostas, muito aquém do que se espera
de um carro de R$ 110 mil – a Honda fez escola nesse sentido, já que Nissan e Hyundai adotaram as mesmas soluções em seus SUVs.
O HR-V herdou a central multimídia do Fit na linha 2019, com Android Auto e Apple CarPlay. Em nosso teste, foi possível até mesmo parear o áudio de um iPod via Bluetooth e espelhar os mapas de um smartphone de forma simultânea. Porém, ela perdeu a entrada HDMI e as linhas dinâmicas da câmera de ré, embora ainda haja três ângulos de visualização.
O motor 1.8 flex de 139 cv (com etanol) garantiu ao Honda desempenho superior somente em relação ao Kicks, com 11s1 no zero a 100 km/h. Em retomadas, conseguiu ficar mais próximo do Creta, com 9s8 na passagem de 60 a 120 km/h (ante 9s3 do Hyundai e 8s3 do Volkswagen). Na frenagem de 100 km/h a zero, o Honda garantiu a boa marca de 38,5 metros percorridos. Em consumo, o utilitário esportivo produzido em Sumaré (SP) garantiu somente a terceira melhor marca, com 8,7 km/l na média PECO.
Se não brilha na análise dos números em pista, no uso comum em ambiente rodoviário o HR-V se destaca perante aos demais. Ele é o segundo mais largo do grupo (com 1.772 mm) e o com menor vão livre do solo (177 mm), o que joga a favor da dinâmica veicular. A suspensão faz trabalho exemplar em curvas, não deixando a carroceria oscilar em excesso no plano transversal. E os novos amortecedores com batente hidráulico fazem um bom trabalho ao diminuir a pancada seca de fim do curso em buracos e imperfeições no asfalto. Pelo equilíbrio apresentado, o HR-V fica em segundo lugar, com 279 pontos.
1º – VW T-Cross Highline
Falta de personalidade é algo do qual o T-Cross não pode ser acusado. Entre todos os modelos aqui reunidos, ele é o que possui desenho mais inusitado – até quando comparado ao visual mais tradicional da linha Volkswagen. Também não faltam a ele recursos da moda neste segmento, como rodas de 17 polegadas, opção de teto na cor preta e apliques plásticos na base das portas.
A extravagância do exterior é replicada até com certo exagero na cabine do novo Volkswagen nesta versão de topo, com apliques na cor bronze no painel, console, portas e até mesmo nos bancos em couro. Nova, a alavanca de câmbio tenta disfarçar o parentesco do SUV com o Polo, assim como a cobertura dos trilhos dos bancos, ausente no hatch. Ao contrário de Golf e Tiguan, não há plástico emborrachado no painel.
A versão considerada é a Highline, que parte de R$ 109.990. De série, o T-Cross 250 TSI traz seis airbags, controles de estabilidade e tração, assistente de saída em rampas, bancos em couro, retrovisor eletrocrômico, sensores de estacionamento na dianteira e traseira, iluminação ambiente em LED, sistema stop-start, detector de fadiga do motorista e sensores de chuva e crepuscular.
O carro das fotos, entretanto, traz uma infinidade de opcionais, como o quadro de instrumentos digital com tela de 12,3 polegadas, o teto solar elétrico, a central multimídia com tela de 8 polegadas, sistema de estacionamento automático e som fornecido pela Beats, que elevam o preço final a R$ 126.410.
Se desanima na análise do preço de compra, o T-Cross compensa parte da diferença com custo zero de revisões até 30 mil km e o melhor consumo médio de etanol do quarteto, com 11,5 km/l. Mérito do motor de menor cilindrada e único turbo entre os SUVs aqui reunidos: sob o capô está o mesmo 1.4 TSI flex de Golf e Jetta, com 150 cv e 25,5 kgfm com etanol ou gasolina – são expressivos 10 kgfm de torque a mais que o Kicks. O câmbio é automático convencional de seis marchas.
Esse conjunto levou o Volkswagen da imobilidade aos 100 km/h em apenas 8s9. É um número que o deixa mais próximo aos outros SUVs turbo do mercado, como Tracker 1.4 (9s1) e C4 Cactus THP (7s3). Voltando aos mais vendidos, o Volkswagen empatou com o Creta na retomada de 40 a 100 km/h (7s4), mas deixou o Hyundai 1 segundo para trás na passagem de 60 a 120 km/h, com 8s3. A superioridade em pista do T-Cross também prevaleceu nos ensaios de frenagem, com ótimos 35,8 metros percorridos ao estancar completamente vindo a 100 km/h.
Apesar de ter a maior distância entre eixos do grupo (2.651 mm), o T-Cross fica por último em comprimento (4.199 mm, 130 mm mais curto que o HR-V), largura (1.751 mm, 29 mm mais estreito que o Creta) e altura (1.570 mm, 65 mm mais baixo que o Hyundai). Além do “size impression” menor, o T-Cross acaba penalizado com o porta-malas mais compacto do quarteto, de apenas 373 litros (enquanto os três rivais superam os 430 l). O Volkswagen até prevê menor inclinação do banco traseiro a fim de ampliar o compartimento para 420 litros. Na prática, porém, o encosto forma ângulo de quase 90º, suprimindo o conforto dos passageiros. Colocando na balança as notas das análises técnica e de mercado, entretanto, o T-Cross sagra-se o vencedor, com 292,5 pontos.
Fotos: Renan Senra