O Kadett representa muito mais do que um carro para seus colecionadores

De tempos em tempos, alguns modelos entram naquela seleta prateleira de clássicos colecionáveis e cravam seu nome na história. Ao invés de caírem no esquecimento, esses carros tornam-se cada vez mais procurados e desejados por seus amantes que, em sua grande maioria, fazem o que for possível para manter a originalidade do modelo.

A história da indústria automobilística no Brasil começa na segunda década do século passado, mas sua consolidação se deu só nas décadas de 1950 e 1960, pelas mãos de Juscelino Kubitscheck, e na década de 1970, quando os modelos dão um grande salto de qualidade. Portanto, os principais clássicos brasileiros vêm destes períodos.

Uma das primeiras marcas a chegar ao país foi a General Motors, em 1925. Mas até o final da década de 1980 a GM tinha produzido apenas três carros no Brasil: Opala, Chevette e Monza. Foi então que veio o Kadett, em 1989, recheado de inovações para a época e com um desenho bem diferente, tirando um pouco aquele visual mais conservador da marca Chevrolet.

Por aqui, era uma grande novidade, mas o Kadett estava no mercado há mais de 50 anos na Europa sob marca Opel, então subsidiária da General Motors. E foi a quinta geração dele que desembarcou no Brasil, depois de anos de pesquisa e investimento de 220 milhões de dólares para adaptá-lo ao mercado nacional. Em abril de 1989 ele foi lançado na versão hatchback duas-portas e, em outubro do mesmo ano, foi lançado na versão station wagon, a Ipanema, primeiro de duas e depois de quatro portas. Em pouco tempo o Kedett virou o sonho de consumo dos brasileiros nos anos 90.

O Kadett foi o primeiro carro produzido em série a utilizar vidros colados, para-choques da cor da carroceria, suspensão traseira regulável a ar, computador de bordo, além do melhor coeficiente aerodinâmico da época, 0,32. De 1989 a 1998, período de produção no Brasil, foram 451.496 unidades vendidas (Kadett e Ipanema); seu sucessor foi o Astra. Para comemorar suas três décadas de vida, fizemos uma reportagem especial com histórias de proprietários em que o modelo é muito mais do que um automóvel.

O Novo Clássico!

A história de Luis Gustavo Hubert com o Chevrolet Kadett é tão grande que hoje ele é reconhecido como “Luis Kadett” e se tornou presidente do Kadett Clube do Brasil, reconhecido pela própria GM. Seu primeiro modelo veio só em 2000, um GSI conversível na cor branca, de 1994, com motor 2.0 com 17,6 kgfm de torque e 121 cv de potência.

“Eu não tenho outros carros clássicos, porque ou você centraliza em um modelo, ou tem que ter muito dinheiro para manter vários diferentes, então eu escolhi o Kadett, um clássico da nova geração. O negócio é centralizar e conhecer profundamente…

Falou em Kadett, o pessoal me procura”, afirma Luis, que hoje tem três modelos em sua garagem: além do GSI conversível de 1994, ele possui um GSI fechado na cor prata, de 1995, e outro GSI conversível na cor vinho, de 1993; todos eles equipados com o mesmo já citado, o 2.0 de 17,6 kgfm de torque e 121 cv de potência. “No exterior só teve carro com capota elétrica, aqui é tudo manual. Foram feitos cerca de 1.600 conversíveis no Brasil, mas hoje é raridade achar um. Se tiver 10 nos encontros aqui em São Paulo, é muito”, ressalta.

Luis conta que todos os seus modelos são totalmente originais e achar peças é uma missão difícil: “Temos que ir garimpando”, explica. Seu GSI conversível vinho, quando ele o comprou, estava todo tunado, então teve que ser refeito quase que por inteiro para ter sua originalidade de volta.

O Clube Kadett do Brasil foi fundado em dezembro de 2001, e em 2005 foi oficialmente reconhecido pela General Motors do Brasil. “Luis Kadett” assumiu em 2011 a coordenação do clube, que realiza encontros e eventos para amantes do modelo.

Com diversas revistas de colecionador na mão, embaladas em sacos plásticos para manter a conservação, Rodrigo Gomes conta que se apaixonou pelo Kadett quando deu uma volta no modelo de seu tio, um GS 1990, e desde então virou sua ambição comprar um. Em dezembro de 2015 conseguiu comprar um GS 1989, de motor 2.0 L com 17,3 kgfm de torque e potentes 110 cv, e já entrou para o Kadett Clube no mesmo mês.

“Quando eu o comprei ele estava muito mexido. Então eu me associei ao Clube para tirar dúvidas e em pouco tempo fiz uma grande transformação para retomá-lo à originalidade, o “Luis Kadett” me ajudou demais nesse processo”, conta Rodrigo.

“Esse carro mudou minha vida. Eu já tive problemas de saúde, como depressão, e ele me ajudou muito no processo de recuperação. Toda a parte de montagem, de ir atrás de peças, de ver os resultados, foi uma terapia muito grande para mim, além de ele ajudar a socializar com outras pessoas dentro do Clube. É realmente uma relação muito forte, para mim e para minha família”, exalta Rodrigo, com muito orgulho e gratidão.

Outro membro do grupo que tem uma história muito afetiva com o carro é Anderson Monma, mas no seu caso, é com uma Ipanema SL/E, de motor 1.8 L com 14,5 kgfm de torque e 95 cv de potência. “Meu pai comprou a Ipanema em 1993, mas seu modelo é de 1989. Eu cresci dentro dela, tenho lembranças de ir passar o Ano Novo na casa da minha avó, em Mogi das Cruzes, e dormirmos dentro do carro, eu e meu irmão”, relembra Anderson, que completa dando risada ao mostrar as marcas de mordida de cachorro no para-choque traseiro. “Isso é herança dos nossos dois Filas, não tinha nem como dar bronca”, brinca.

Com o passar dos anos, o carro foi ficando meio abandonado, chegando a ficar longos períodos sem sair da garagem. A Ipanema tinha um valor sentimental tão grande para a família que Anderson decidiu restaurá-la e levar seu pai, que estava doente naquela época, para dar uma volta nela, “Quando eu a peguei, fui até à casa do meu pai, e quando cheguei ele estava caminhando na rua, meio cabisbaixo. Parei do lado dele. Quando ele viu a Ipanema, os olhos dele brilharam de uma forma que me emociona até hoje. Foi uma das maiores gratidões da minha vida”, conta Anderson. Seu pai já é falecido. “Um clássico passa a ser um clássico quando ele desperta memórias afetivas nas pessoas”, essa frase foi comum aos três entrevistados.

Fotos: Saulo Mazzoni

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